A ÚLTIMA BOLACHA DO PACOTE! NÃO!

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Aquele era um dia comum na palestina: pescadores consertando suas redes a beira do lago, agricultores cultivando a terra debaixo de um forte sol, mulheres cuidando de seus afazeres e crianças correndo e brincando energicamente nas aldeias e povoados. Enquanto isso, em um monte próximo, Jesus dava inicio ao seu mais conhecido e perturbante ensino: o sermão do monte. O Mestre começou dizendo: Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus (Mt 5.3). O choque foi imediato. Sobrancelhas se levantaram em sinal de espanto e testas franziram de perplexidade. “O mestre se refere aos pobres de uma perspectiva sociológica ou espiritual?”, alguém certamente poderia ter perguntado. E, esta, aliás, parece de fato uma questão inevitável. Assim sendo, se você prestar atenção, existe uma discrepância, pelo menos verbal, entre as bem-aventuranças contidas no evangelho de Mateus e as de Lucas. Deste modo, Lucas diz: “Bem-aventurados vós os po-bres” (Lc 6.20), enquanto que Mateus declara: “Bem-aventurados vós, os pobres de espírito”. Será que existe uma discordancia entre Mateus e Lucas? É obvio que não. A pobreza a qual Jesus faz mensão aqui é de fato a pobreza espirtual. Afinal de contas, se Jesus estivesse se referindo aos pobres do ponto de vista sociológico, estaria afirmando que o simples fato de alguém ser pobre garantia a ele a entrada no reino de Deus, excluindo assim a necessidade de arrependimento e conversão.

Não estamos sugerindo com isto que Jesus fosse indiferente à pobreza e a fome. Ele sentia compaixão pelos neces¬sitados e alimentava os famintos, e disse aos seus discípulos que fizessem o mesmo, segundo Stott. Mas a bênção do seu reino não era primordialmente uma vantagem à uma classe social específica. Os pobres de espírito aos quais Jesus faz mensão neste sermão são aqueles que entendem que não possuem recursos próprios capazes de salvá-los; que não possuem nada que os tornem merecedores da graça de Deus. São aqueles que percebem que nada tem a oferecer em troca de perdão e da misericórdia. Sim, estes são os pobres de espírito. Não são aqueles que ostentam ou exibem uma espiritualidade impecável e uma santidade elevada. Em outras palavras o reino não pertence aos que “acham a ultima bolacha do pacote”. Pelo contrário, o reino pertence aqueles que são humildes o bastante para reconhecerem sua pobreza espiritual. São os maltrapilhos espirituais, aqueles que, enquanto escutam o fariseu dizer “graças te dou oh Deus por não ser como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros”, sequer são capazes de levantar os olhos aos céus, mas dizem humildemente: “Ó Deus, sê propício a mim pecador!” (Lc 18.9-14). Esses, e tão somente esses, recebem o reino de Deus. Pois o reino de Deus que produz salvação é um dom tão absolutamente de graça quanto imerecido (Stott). Tem de ser aceito com a humildade daquele que se vê como pobre, incapaz de fazer por merecer tal dádiva. Desta forma gostaria lhe perguntar: você percebe essa qualidade espiritual em si mesmo? Bem, existe algumas maneira de descobrir isto. A mais facil é examinarmos o modo como nos relacionamos cotidianamente com Deus e com as pessoas. Se no dia a dia recriminamos as pessoas com quem convivemos no trabalho, na faculdade ou até mesmo em casa, nos arvorando como seus juízes, colocando-nos numa posição de superioridade moral e ética sempre condenando-os é porque provavelmente não enxerguemos ainda com clareza nossa própria fraqueza moral. Do mesmo modo, quando nos relacionamos com Deus diariamente e não somos capazes de perceber sua graça e de nos sentirmos extremamente favorecidos por ele é porque não somos conscientes ainda de nossa ultrajante pobreza espiritual. Seja como for, meu convite a você hoje é este: seja humilde em seu relacionamento com as pessoas com quem convive e com Deus e, então, você descobrirá a felicidade de ser surpreendido cotidianamente pela graça de Deus. Pois como disse o Mestre: “Felizes são os pobres de espírito, pois deles é Reino de Deus” (NVI).

Referência: STOTT, John R.W. Contracultura cristã. ABU, São Paulo, 1981.

Fonte: FUMAP

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